Daniella Pacheco - Reporter
“Quer no pequeno mundo norte-rio-grandense, quer na política nacional, Eloy de Souza foi uma testemunha e mesmo um autor. Jornalista, economista, conversador magnífico. Viajou pela Europa. Viu a Grécia e o Egito, estudando-os de perto. Faleceu com 86 anos, outubro de 1959. Não era possível que essa vida nobremente exercida no plano parlamentar e político, a visão de um homem brilhante, honestíssimo, memória excepcional, deixasse unicamente algumas centenas de artigos e anedotas que o tempo faria evaporar nas lembranças contemporâneas. Insisti anos e anos para que escrevesse suas reminiscências”, essas palavras escritas por Luiz da Câmara Cascudo mostram um pouco da dimensão e da importância de Eloy de Souza e dos seus artigos e observações que retratam parte da história política e cultural do Rio Grande do Norte e do Brasil. No ano do cinqüentenário de falecimento dele é marcado com o lançamento da segunda edição do livro “Memórias”, amanhã, às 20h, na Casa de Cultura de Macaíba.
A jornalista, pesquisadora, escritora e neta de Eloy de Souza, Rejane Cardoso foi a responsável pela organização dessa edição, onde acrescentou fotos do acervo de família, notas e um índice onomástico. “Quem estimulou a produção desse depoimento histórico foi Câmara Cascudo, inclusive foi quem datilografou as primeiras 180 páginas e assina o prefácio. Nos anos sessenta, Cascudo era o grande biografo dos irmãos de Eloy, Henrique Castriciano e Auta de Souza. E, insistia para maior jornalista do Estado, registrar suas lembranças”, diz Rejane Cardoso.
Eloy de Souza decidiu começar a ditar seus pensamentos e outras pessoas datilografavam, “personalidades como Câmara Cascudo, Leonardo Bezerra e meu pai Omar Lopes Cardoso desempenharam essa função por amizade e admiração, como demonstra Câmara Cascudo quando declarou “suas “memórias” compõem a série de retratos de vitalidade natural, sem ódio, inveja, desdém”, lembra a jornalista.
Quando ele morreu, tudo que foi escrito nesse registro ficou espalhado. Em 1975, Sanderson Negreiros assumiu a presidência da Fundação José Augusto e decidiu publicar a primeira edição de “Memórias”, e delegou a missão de organizar todo o material para o jornalista Leonardo Bezerra. “Reconheço que essa missão foi muito difícil, digamos quase impossível. Afinal, é possível que algumas partes tenham-se perdido. Lembro que o próprio autor já com mais de oitenta anos de vida, tentava ordenar aqueles papéis, colocando com uma nova numeração com uma letra bem grande nos cantos das páginas”, afirma Rejane.
Segundo a pesquisadora, “Com o lançamento desta edição que é a consolidação das memórias de Eloy de Souza estou realizando um grande sonho. Comecei esse trabalho em meados dos anos noventa, foi um trabalho longo e exaustivo, embora prazeroso, sou muito detalhista e tive muito cuidado e carinho organizando esta obra. Em muitos momentos cheguei me emocionar com as lembranças e pelos relatos que encontrei onde demonstrava o caráter de um homem honrado, honesto, guerreiro, atencioso e sertanejo que foi o meu avô”.
Nesta edição, a pesquisadora Rejane Cardoso, acrescentou notas, fotos histórias e um índice onomástico, onde relacionou todos os nomes citados por Eloy no seu livro. “Este livro é rico em episódios e figuras humanas, diante disso, observei que a edição anterior estava muito difícil de ser lida, então decidi inserir verbetes elucidativos das expressões regionalistas, muitas em desuso; de situar lugares e contextualizá-los; de fixar publicações e citações bibliográficas. Foi uma tarefa que tive que me dedicar com afinco, porque ele cita 900 nomes, que vai desde escravos até deuses, lá o leitor vai encontrar pessoas de Recife, Macaíba, Natal, Rio de Janeiro (onde foi senador e o deputado mais novo Brasil), Europa e Ásia. Um trabalho minucioso, onde detalhei da seguinte forma: o nome, como a pessoa era mais conhecida e algumas curiosidades, tudo em formas de verbetes”.
O trabalho de pesquisa caminhava a passos largos, quando no ano passado, surgiu à oportunidade de publicar. ”Estava no lançamento do livro de Otacílio Alecrim, quando o senador Garibaldi Filho declarou “que o senado estava de portas abertas para novas propostas de livros que tivessem importância e registrasse a memória cultural do Rio Grande do Norte. Percebi que aquele era o momento de apresentar esse projeto. Agora, essa obra incorpora ao acervo da instituição a edição definitiva das memórias deste pernambucano que estudou e defendeu o Rio Grande do Norte”, disse a jornalista.
Além de jornalista e um grande político, Eloy de Souza se destacou pelos seus estudos a procura de uma solução para o problema que afetava todo o nordeste brasileiro, a seca. Ele foi autor dos fundamentos e justificativas de criação do IFOCS – Instituto de Fomento às Obras Contra as Secas, depois do Departamento Nacional de Obras Contra as Secas, e também propôs a Lei do Natal que incentivava a construção de estradas e açudes, como meio para sanar a falta de água.
“Eu convivi com ele até os meus dez anos de idade. Ele foi o segundo marido da minha avó. Ele não tinha filhos, mas, considerou os filhos e os netos da sua amada como seus. Todos os dias no final da tarde, Eloy chegava à minha casa para visitar seus netos, eu e os meus irmãos, Selma e Otomar. É, assim que me lembro dele uma pessoa carinhosa, atenciosa e que sempre deixava bilhetes que guardo até hoje como um tesouro”, lembra.
Além da publicação atualizada do livro “Memórias”, Rejane Cardoso segue o trabalho de preservação da memória do seu avô Eloy de Souza, “estamos no processo de digitalizar todas as obras dele”, disse ela. O próximo projeto da pesquisadora é organizar um livro com os artigos que ele escrevia sobre os costumes sertanejos, com uma linguagem mais coloquial e usava o pseudônimo de Jacynto Canela de Ferro. “Esse trabalho de Eloy é considerado um importante trabalho etnográfico. Ele foi pioneiro na literatura sertaneja, onde retratava o dia-dia e os costumes locais do sertão”, disse Rejane.
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