Drª Sônia Maciel de Andrade
Lembro-me que o Capitão Rodrigo Cambará, de “Um certo Capitão Rodrigo” (terceiro episódio de “O Continente” da trilogia “O tempo e o Vento”, de Érico Veríssimo), tinha um único medo: o de morrer em cima de uma cama, velado pela família. Ele queria morrer peleando. Desafiava a morte com suas armas de guerra. Esse tipo de morte, ele não temia. Ao contrário, desprezava quem a temesse. O Capitão Rodrigo tinha suas razões, pois peleava contra seus inimigos e o maior deles era a morte.
Minha irmã Sônia tinha a coragem do Capitão Rodrigo. Não evidentemente para as pelejas com armas na mão. Mas para as lutas, através de atitudes, em favor daquilo em que acreditava. Formava suas convicções com incrível lucidez e não apenas as defendia como tentava praticá-las. Eram sempre convicções próprias, pessoais, de caráter racional ou emocional, mas profundamente estabelecidas. Quer se tratasse de assuntos políticos, ideológicos, literários ou religiosos. Não se dobrava aos preconceitos. Por isso mesmo nunca se acomodou, nunca transigiu, nunca se acovardou diante das hipocrisias que formam as convenções sociais. Sua inteligência, excepcional, brilhante, de uma capacidade de verbalização absolutamente incomum, a conduziu à rebeldia, à rejeição dos valores dominantes, à adesão, ainda que solitária, às causas dos desafortunados. Estava invariavelmente ao lado das vítimas de injustiças de qualquer tipo, por mais ousadas e desafiadoras que fossem suas posições. De resto, tínhamos admiração mútua e respeito por nossas divergências. Por isso, fomos sempre grandes amigos, relevando os defeitos um do outro. A morte terá rompido esses laços?
Ivan Macield e Andrade - Tribuna do Norte, 12 de março de 2011
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