A assistência médico-hospitalar na capital do Rio Grande do Norte, no principio do século passado era prestada unicamente no Hospital de Caridade, chamado de Salgadeira, no lugar onde hoje funciona a Casa do Estudante. Fora criado pelo presidente Passos, por volta de 1856 para enfrentar uma epidemia de peste que assolou a capitania. No pacote foi construÃdo o cemitério do Alecrim com a proibição do enterro de pessoas no chão das capelas e igrejas. O hospital recebera o nome de Salgadeira por haver sido construÃdo no lugar de uma antiga feira de carnes salgadas, um arremedo de arquitetura de um hospital. – Não era um estabelecimento modelar, mas um depósito de doentes desenganados, moribundos e pestilentos que as famÃlias abandonavam à própria sorte. Um prático de enfermagem funcionava como anjo da guarda, muito mais ajudando a morrer do que a curar. – (ARAUJO, iaperi. História da Faculdade de Medicina). Era dirigido pelo médico Pedro Soares com o auxilio dos doutores Afonso Barata e Segundo Wanderley.
              A situação do hospital era tão critica, que os próprios médicos do corpo clÃnico, no final de 1905 pediram ao governador Alberto Maranhão a sua desativação, o que foi feito em beneficio dos próprios doentes.
              No final de 1906, chegava a Natal, vindo da tradicional Faculdade de Medicina da Bahia, o médico Januário Cicco que obtivera seu doutorado defendendo a tese – Do destino dos cadáveres – onde defendia a cremação dos corpos como forma de minimizar a dimensão dos cemitérios na estrutura urbana das cidades.
              Inconformado em não ter em Natal um hospital, o Dr. Januário Cicco procurou o governador Alberto Maranhão, propondo a construção de um hospital para a capital, oferecendo como sugestão um lugar no cimo do monte de Petrópolis, onde existia uma casa de veraneio da famÃlia do governador.
              Para resolver a situação legal, Alberto Maranhão vendeu a casa a Aureliano Medeiros que a repassou ao Estado para adaptá-la como hospital. Com a escassez de recursos o Dr. Januário Cicco, que tomou a frente das obras, saiu pedindo ajuda aos comerciantes mais abastados da capital que forneciam materiais e mão-de-obra para as reformas necessárias na casa de veraneio. Encontrou no industrial Juvino Barreto um grande benemérito que não permitiu em ocasião alguma que as obras fossem paralisadas por falta de dinheiro, razão pela qual seu nome foi escolhido para o novo Hospital de Caridade, criado pelo decreto 205 de 21 de agosto de 1909. Em 23 de agosto o Dr. Januário Cicco foi nomeado diretor do hospital, que em 9 de setembro foi inaugurado solenemente. Nessa mesma data, chegavam para auxiliar nos trabalhos, as irmãs filhas de Santana sob o comando da sóror Clemens Rizzi e um único auxiliar, o enfermeiro José Lucas. Eram 18 leitos para homens e 13 leitos para mulheres que a operosidade do Dr. Januário Cicco fez aumentar gradativamente para 70 por volta de 1917, quando o Governo do Estado nomeou outro auxiliar, o Dr. Otávio Varela.
              Depois vieram os Drs. Adolfo Ramires e Clidenor Lago para assumirem as clÃnicas de Oftalmologia e Odontologia e mais o Dr. Vale de Miranda para assumir o Laboratório de Análises ClÃnicas.
Em 1920 o Dr. Januário criou o pavilhão de pensionistas para atender os pacientes que pudessem arcar com as despesas do tratamento hospitalar, gerando renda para o hospital que sofria do mal crônico da falta de verbas.
              O Hospital era público, oficializado pela lei 311 de 2 de dezembro de 1911, mas o Dr. Januário Cicco procurando uma alternativa para as dificuldades do seu custeio, criou em 25 de maio de 1927 a Sociedade de Assistência Hospitalar com a finalidade de terceirizar a administração do hospital. Junto a ele, na direção da sociedade, ficaram os senhores José Lagreca, João Crisóstomo Galvão e Fernando Pedrosa. Em 30 de junho foi firmado o contrato de terceirização do hospital com a obrigação do Estado de pagar uma subvenção anual de cem contos de réis para custear os tratamentos dos indigentes. Nessa época entraram para o corpo clÃnico do hospital os Drs. Ernesto Fonseca, Luiz Antonio, José Tavares e posteriormente Aderbal Figueiredo.
              Em 1929, foi instalado no Hospital de Caridade uma secção de ObstetrÃcia. Desde 1927, o Dr. Januário Cicco conseguira do prefeito de Natal, Omar O’Grady de Paiva a doação de uns terrenos anexos ao hospital para construir uma maternidade, cuja fundação se deu em 18 de março de 1928 e sua construção iniciada em 14 de janeiro de 1932. Seria a Maternidade de Natal, o Palácio da mãe pobre, no dizer de seu criador. Em 1935, o hospital teve seu nome mudado para Miguel Couto.
              Por quase 50 anos o Dr. Januário Cicco administrou o hospital com rigor e austeridade. Procurava se inteirar de tudo que se passava nas instituições que administrava. A maternidade fora inaugurada em 12 de fevereiro de 1950 e era mais um encargo administrativo na vida do médico que fizera tudo com profissional. ClÃnico, cirurgião e obstetra. Nada se fazia sem seu conhecimento. Das dietas dos pacientes à falta de medicamentos ou até uma discussão entre as lavadeiras que militavam nos dois hospitais.
              Em 1° de novembro de 1952, faleceu em sua residência de um infarto. Junto ao seu leito de morte os Drs. Onofre Lopes e Heriberto Bezzerra. Mandou chamar o governador Sylvio Pedroza e pediu que o Estado fizesse a doação do hospital e de toda área do entorno a Sociedade de Assistência Hospitalar. Ele pensava numa faculdade de medicina e na futura universidade. Ao Dr. Onofre Lopes, pediu que não deixasse desaparecer sua obra meritória e concretizasse seus sonhos. Foi sepultado num mausoléu no cemitério do alecrim junto a sua mulher Dona Bebé e sua filha Yvette, falecidas em 1937.
              Dr. Onofre Lopes em 29 de janeiro de 1955 criou a Faculdade de Medicina. Em 25 de junho de 1958, a Universidade do Rio Grande do Norte.
              Nos últimos 50 anos, o Hospital Universitário mudou mais duas vezes de nome. Em 1974, passou a Hospital das ClÃnicas e em 1984 a Hospital Universitário Onofre Lopes, em homenagem ao seu consolidador.
              Entre outros, dirigiram a instituição os médicos Januário Cicco, Onofre Lopes, Cleone Noronha, Jair Nogueira, Airton Wanderley, Olavo Medeiros, Vital Amorim e José Lagreca, o atual. Todos deram sua contribuição para que o hospital se tornasse a maior referência na assistência médica do Estado, mas principalmente, um instrumento na formação profissional de médicos, enfermeiros, nutricionistas, fisioterapeutas, e todas as profissões da saúde no Estado.
              Conserva na sua essência o ideal do Dr. Januário Cicco, visionário e empreendedor, e a força do Dr. Onofre Lopes que fez material os sonhos do seu criador.
O Jornal de Hoje - Natal, 11 de setembro de 2009
Escrito por: Iaperi Araujo
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