Se fosse viva, Giselda Trigueiro teria 85 anos de idade no próximo 18 de fevereiro de 2019. Nasceu em Vila Velha, Ceará, e faleceu em Natal, aos 52 anos, vítima de câncer de mama. Graduou-se no Recife, nos cursos de filosofia e de medicina, e, em 1957, casou-se com o médico natalense Kerginaldo Trigueiro, seu colega na Faculdade. A família se completou com os nascimentos de Franca, Gustavo e Carla. Os dois primeiros seguiram a profissão dos pais, e a mais nova optou pela área do direito. Muitas pessoas somente conhecem o nome Giselda Trigueiro, porém, não sabem o quanto a vida dessa mulher representou para a medicina do Rio Grande do Norte. Não só para a medicina, mas também para diversas outras atividades, pois ela engrandeceu o cenário humano desta terra, com sua participação efetiva e com sua simpática presença. O único hospital de doenças infecto-contagiosas do Estado tem o seu nome; nada mais justo, porquanto, a essa área de estudos, ela dedicou todo seu empenho de médica exemplar e de sapiente mestra.
Não estava entre os professores fundadores da então Faculdade de Medicina de Natal – criada em 1955 –, mas merece destaque seu labor na área das doenças infecciosas e tropicais, desde os instantes primevos do ensino médico no Estado. Nessa função, ao longo do tempo, fez escola. Com inteligência, denodo e árduos estudos, foi capaz de se afirmar como líder natural de uma equipe coesa, em função de um projeto de excelência no ensino e na pesquisa, além do desvelo total aos doentes, quase todos vindos de populações de baixa renda. Sou partícipe e testemunha dessa jornada humana, cultural e científica, vivida sob o teto do antigo Hospital Evandro Chagas, tendo à frente a figura singular da Dra. Giselda. Formou um núcleo acadêmico que mantém, até hoje, os ideais que ela deixou. Todos aprendiam muito no serviço clínico por ela criado e dirigido, tanto no que concerne à própria especialidade, quanto ao amor à medicina, além do respeito aos cânones da ciência e da ética.
Afora as funções de médica e professora, Giselda Trigueiro também foi chamada a assumir tarefas de gestão, as quais foram cumpridas sempre com o mesmo sucesso. Por cerca de 25 anos, ocupou a direção do Hospital Evandro Chagas, foi chefe do Departamento de Infectologia e Coordenadora do curso médico da UFRN; dirigiu a Associação Médica do RN e a Sociedade de Médicos Escritores do Estado. Manteve intercâmbios e vínculos com os mais famosos professores da especialidade no Brasil, e era expoente nacional no estudo clínico do tétano. Livre Docente pela UFRN, com vários trabalhos de pesquisa apresentados no Brasil e no exterior, criou a Residência Médica em Infectologia, da qual, a seu convite, fui o primeiro coordenador. Ao lado de ilustres colegas, fundou e integrou a Academia de Medicina do Rio Grande do Norte.
Elegante – no sentido mais amplo da palavra –, era altiva, digna, culta e corajosa. Quando ouviu a sentença de que sobreviveria somente de 2 a 3 meses, devido ao avanço da doença, ela disse ao médico norte-americano que a tratava: “Obrigada Doutor, pelos seis anos de vida que o senhor me deu”. Consciente da inelutável situação de saúde, escreveu o próprio epitáfio, típico para a sua visão da vida e do mundo: “Aqui jaz Giselda, muito contra a vontade”.
Tribuna do Norte 07/02/2019 - Daladier Pessoa Cunha Lima - Reitor do UNI-RN
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